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Resenha: Quarto de Despejo - Diário de uma favelada


Quarto de Despejo: Diário de uma favelada (1960) é o nome do livro escrito por Carolina Maria de Jesus entre julho de 1955 e janeiro de 1960. Carolina foi uma mulher preta, escritora e poetisa que viveu na Favela do Canindé (SP) com seus três filhos - João José, José Carlos e Vera Eunice. Em seus escritos, registrava o dia a dia na favela e as dificuldades para viver com poucos recursos financeiros obtidos do trabalho como catadora de papel. Dos relatos encontrados no Diário, aqueles referentes à fome são os mais constantes e os mais difíceis de ler. A fome que, nas palavras da autora, é amarela, não é algo que aparece uma ou duas vezes no decorrer dos 5 anos de registro, mas semana após semana e, não raramente, dia após dia, exatamente como ela é: uma dor insuportável e inquietante no estômago, que leva embora o sono, provoca tontura e deixa as pessoas irritadiças. É assim que Carolina descreve, diversas vezes, as sensações que permeiam seu cotidiano de barriga vazia.

Um senhor que tropegava pelas ruas, não de embriaguez, mas de fome. Um rapaz que faleceu após consumir uma carne meio crua que havia encontrado no lixo, pois de tão faminto, não conseguiu aguardar até que estivesse completamente assada. A notícia nos jornais sobre uma mulher que com seus três filhos cometeu suicídio. Estas são algumas das histórias reais presenciadas por Carolina e contadas em Quarto de Despejo.

Em 2021, 61 anos após a primeira publicação do livro, o Brasil retornou ao mapa da fome. Pessoas revirando carnes descartadas por supermercados em busca de ossos e sebo, a falta de dinheiro para compra do gás de cozinha, gente sendo presa e assassinada por furtar comida, são notícias recentes, mas que não se distanciam das cenas observadas por Carolina na década de 50.

A insegurança alimentar que atualmente atinge milhões de brasileiros não é decorrente da falta de comida - o Brasil é um dos maiores produtores de alimentos do mundo, mas consequência da falta de políticas para garantir o acesso à alimentação adequada e saudável e, também, da destruição de políticas e órgãos já existentes, como a extinção do Consea e o sucateamento do PNAE.

Em 31 de julho de 1959, Carolina escreveu: “... Eu disse para os filhos que hoje não vamos comer. Eles ficaram tristes.” Quantas crianças têm vivenciado, hoje, o mesmo que João, José e Vera viveram durante a infância?


Texto: Karine Melo do Nascimento


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